A escassez mundial de medicamentos para terapia de reposição hormonal deixa as mulheres em dificuldades
Karen Golden consegue se lembrar vividamente dos sintomas da menopausa que sentiu durante a escassez de sua medicação de terapia de reposição hormonal (TRH) cinco anos atrás.
"Não foi um bom momento", lembrou a advogada de Toronto. Ela havia começado a fazer TRH para lidar com problemas de sono e ansiedade relacionados à menopausa há vários anos.
Mas em 2020, houve escassez dos medicamentos que ela tomava. Seu médico tentou trocá-la por outros produtos, mas eles causaram efeitos colaterais, então Golden decidiu interromper a TRH e os sintomas retornaram.
Golden é uma das muitas mulheres ao redor do mundo afetadas pela escassez mundial de medicamentos de TRH, usados para ajudar a controlar os sintomas da menopausa. A escassez deixou as mulheres em apuros, incapazes de encontrar alívio para sintomas que variam de incômodos a debilitantes.
O Drug Shortages Canada , um banco de dados online sobre escassez e descontinuação de medicamentos no país, mostra que, desde 2017, houve 92 desabastecimentos e quatro descontinuações de produtos que contêm estradiol, uma forma de estrogênio comumente usada em medicamentos de TRH. Os produtos incluem adesivos transdérmicos, pílulas, anéis vaginais, géis e cremes tópicos.
"Se a mulher não conseguir tomar a medicação, ela não vai funcionar tão bem. Ela não vai dormir. Seu humor pode piorar significativamente", disse a Dra. Alison Shea, obstetra-ginecologista e professora assistente da Universidade McMaster, ao programa Day 6 da Rádio CBC.
A menopausa ocorre 12 meses após a última menstruação. A perimenopausa, a fase que a antecede, acompanha alterações hormonais que duram em média sete anos, mas podem ser mais longas para algumas. Durante esse período, muitas mulheres apresentam ondas de calor, suores noturnos, dificuldade para dormir, alterações de humor e libido, ou dificuldade de concentração — sintomas que podem ser tratados com terapia hormonal.
A escassez de TRH também representa um fardo para médicos e farmacêuticos, disse Shea, pois eles precisam gastar mais tempo procurando alternativas para seus pacientes, aumentando o estresse de um sistema de saúde já sobrecarregado.
"Então, na verdade, é um caos para todos", disse ela.
De acordo com uma declaração escrita da Health Canada, no momento, os medicamentos para TRH estão disponíveis no Canadá, com exceção dos adesivos de estrogênio/progesterona. A previsão para o fim dessa escassez é julho ou agosto.
Enquanto isso, algumas mulheres que dependem desses medicamentos sentem que a escassez não está sendo tratada adequadamente e se preocupam que sua saúde não esteja sendo levada a sério.
Embora Golden tenha parado de tomar TRH devido à escassez de 2020, ela conseguiu voltar a tomar sua medicação original no ano passado. Mas, depois de apenas alguns meses, ela descobriu que estava novamente em falta.
Como estava ficando sem medicamento, ela entrou em contato diretamente com a empresa farmacêutica responsável pelo medicamento. Disseram-lhe que estavam atendendo aos pedidos de "maneira equitativa" e que levaria algumas semanas para se estabilizar.
Golden não aceitou a resposta. Depois de algumas idas e vindas com a empresa, eles concordaram em enviar parte do estoque para a farmácia local dela.
Mas ela não acha que outras mulheres devam ir a tais extremos para ter acesso confiável a medicamentos de TRH.
"Seria útil se os tomadores de decisão soubessem que dar medicamentos às pessoas para sua saúde física e mental e depois retirá-los é perigoso e antiético", disse ela.
Uma cadeia de suprimentos complexaMina Tadrous, farmacêutica e professora associada do departamento de farmácia da Universidade de Toronto, disse que pode ser complicado identificar a origem exata de uma escassez.
Os medicamentos geralmente passam por vários países e diversas instalações antes de chegar às farmácias canadenses, disse ele.
"Se alguma coisa nessa cadeia de suprimentos quebra, parece um trem lento, porque leva algumas semanas ou meses para acontecer", disse Tadrous.
Além disso, a fabricação de hormônios é particularmente especializada, envolvendo reações químicas específicas e manuseio cuidadoso de moléculas sensíveis.
"Você tem um produto que é um pouco mais difícil de fazer e, de repente, também tem pouquíssimas empresas ativas no mercado", disse ele.
Produzir um medicamento pode levar de 18 a 24 meses — desde a obtenção de matérias-primas até a produção, o controle de qualidade e a distribuição, disse Christian Ouellet, vice-presidente de assuntos corporativos da empresa farmacêutica Sandoz Canada, que produz uma variedade de produtos de TRH.
"Fabricar uma molécula não é como fabricar pão — é complexo", disse ele, observando que os fabricantes sempre querem atender aos requisitos de qualidade, eficácia e segurança.
Embora tenha havido escassez de medicamentos de TRH da Sandoz Canadá nos últimos anos, Ouellet disse que a empresa está atualmente atendendo à demanda.
Em uma declaração por escrito, o porta-voz da Health Canada, Mark Johnson, disse que quando ocorre escassez de medicamentos, a empresa "trabalha em estreita colaboração com fabricantes, prestadores de serviços de saúde e províncias e territórios para monitorar a situação e explorar opções de mitigação da escassez".
Especificamente no caso dos medicamentos de TRH, a escassez é motivada principalmente por um aumento recente na demanda, que Ouellet disse ser "várias vezes maior do que era há cinco anos".
De acordo com dados agregados de reivindicações da Manulife , uma das principais seguradoras do Canadá, houve um aumento de 21% no número de mulheres de 45 a 65 anos que buscaram TRH para sintomas da menopausa entre 2020 e 2023.
Vários especialistas apontam as mídias sociais e a maior defesa da saúde das mulheres como fatores que impulsionam a demanda.
Um estudo de 2002 que relacionava medicamentos de TRH ao aumento de casos de câncer de mama e doenças cardíacas também foi desmascarado na última década, resultando em mais médicos prescrevendo-os.
Muitos desses medicamentos também são prescritos na terapia hormonal de afirmação de gênero. De acordo com a Dra. Kate Greenaway, diretora médica da Foria, uma clínica virtual que oferece atendimento de afirmação de gênero, essa escassez "pode ser um pouco mais profunda" para a comunidade trans e não binária, devido ao número limitado de alternativas no Canadá.
Também houve escassez de outros hormônios usados em cuidados de afirmação de gênero, disse ela, como bloqueadores de andrógenos e testosterona, e é difícil prever quais produtos se tornarão escassos e quanto tempo a escassez durará.
Tadrous disse que está cético de que veremos o fim da escassez de TRH sem grandes ações, como aumentar a produção ou dar aos farmacêuticos a autoridade para substituir uma terapia que não está disponível por outro medicamento equivalente ou uma combinação de medicamentos.
Apesar do fato de a demanda por TRH ter crescido, ainda é um mercado relativamente pequeno em comparação a outros medicamentos, disse Tadrous, observando que aumentar o tamanho do mercado de medicamentos de TRH — em outras palavras, prescrevê-los para mais mulheres — pode, na verdade, incentivar os fabricantes a aumentar a produção em geral.
"Se realmente o usássemos com mais frequência, as empresas farmacêuticas iriam querer produzir mais", disse ele.
Alguns especialistas em menopausa querem ver o acesso aos medicamentos de TRH expandido.
A Dra. Michelle Jacobson, ginecologista que faz parte do conselho da Sociedade Canadense de Menopausa, acredita que toda mulher que esteja na idade média da menopausa, não tenha outros problemas de saúde graves e esteja apresentando sintomas como ondas de calor e suores noturnos deve receber terapia hormonal.
"Isso é consenso entre todas as diretrizes e organizações que têm opiniões sobre a menopausa", disse ela. Mas ela acrescenta que alguns médicos ainda hesitam em prescrever terapia hormonal — às vezes apenas por falta de conhecimento.
"Não devemos deixar que nossos preconceitos atrapalhem o que todas as organizações e a Health Canada estão nos dizendo que é apropriado."
cbc.ca
