Por que Lauryn Hill só tem um álbum de estúdio, lançado há 27 anos?

Lauryn Hill em 1998, em sessão de fotos para 'The Miseducation of Lauryn Hill' — Foto: Reprodução

A cantora, que era do bem-sucedido Fugees, tinha tudo para engatar uma carreira estratosférica nos anos 2000. Era o nome do momento, com convites para atuar em grandes franquias e ganhando milhões de dólares. Mas conflitos com gravadora, imagem e vida pessoal não ajudaram. Entenda por que Lauryn Hill só tem um álbum solo:

“The Miseducation of Lauryn Hill” parecia o início de uma trajetória prolífica para Hill, não só como artista, mas como figura pública. Com mais de 20 milhões de cópias vendidas, tornou-se o disco mais vendido de uma artista mulher em toda a história do hip hop.

Segundo a “Rolling Stone”, a cantora chegou a receber convites para atuar em filmes como "As Panteras", "Matrix" e a franquia "Bourne". "As portas estavam abertas para Hill criar um império de entretenimento multimídia do tipo que J. Lo, Janet e Madonna construíram", diz a revista.

Mas a cantora afirma que, mesmo com todo o sucesso, ela nunca recebeu apoio da Columbia (sua gravadora na época) para lançar um novo disco. Em 2002, Lauryn chegou a lançar um acústico MTV (o "MTV Unplugged No. 2.0") e até incluiu músicas inéditas, mas não era bem um álbum de estúdio como o primeiro.

"A coisa mais maluca é que ninguém da gravadora nunca me procurou e me perguntou: 'Como podemos te ajudar a fazer outro disco?'. Nunca", afirmou à “Rolling Stone” americana em 2021.

Apesar disso, em uma reportagem publicada pela própria “Rolling Stone” em 2003, há relatos de que a Columbia ajudou a construir um estúdio no apartamento de Hill, porque ela não queria se deslocar. Na matéria, a gravadora afirmava que o novo álbum da cantora viria no ano seguinte (2004). Não está claro o que aconteceu, mas o disco nunca veio.

Outro problema relacionado ao disco foi judicial. Lauryn foi processada por quatro homens que trabalharam em “Miseducation”, e que alegaram que ela havia reivindicado todo o crédito por músicas com as quais eles também tinham colaborado. Isso fez com que a cantora tivesse que entrar em uma batalha judicial, prestar depoimentos e discutir assuntos delicados com advogados.

As partes chegaram a um acordo no processo e, segundo a “Rolling Stone”, os quatro produtores receberam US$ 5 milhões. Mas a revista afirma que esse incidente causou uma “crise de fé e carreira” na cantora, que passava por um período difícil.

Lauryn sempre foi uma figura enigmática, e nunca se deu muito bem com a fama. Tanto que, ao invés de mergulhar no estrelato, ela optou por sumir ao máximo dos holofotes nos anos 2000 – e nunca retornou por completo.

A artista tinha somente 23 anos quando “Miseducation” foi lançado; para Lauryn, havia “muitas tentações e armadilhas” que vinham com a ideia de se tornar uma celebridade, e foi melhor rejeitar tudo isso.

“Tive que me afastar quando percebi que, pelo bem da máquina, eu estava sendo muito comprometida. Eu me sentia desconfortável por ter que sorrir na cara de alguém quando eu realmente não gostava da pessoa, ou mesmo não a conhecia bem o suficiente para gostar dela”, explicou à revista “Essence” em 2003.

“Há uma dependência da imagem ou apenas uma falsa sensação de segurança. Eu criava a partir de um lugar tão sincero e puro, mas essas tentações produziam uma situação muito tóxica para a minha criatividade, para a minha pessoa”.

Além de toda essa dificuldade, Lauryn teve anos turbulentos em sua vida pessoal. Desde 1995, ela se relacionava com o empresário Rohan Marley, filho de Bob Marley, com quem teve os filhos Zion, Selah, Joshua, John e Sarah. Mas o casamento era conturbado, e teve várias idas e vindas até a separação de fato, em 2009.

Apesar de se afastar da vida pública e praticamente não ter material inédito nos últimos 25 anos, Lauryn não deixou de fazer shows. Em 2021, ela falou sobre o assunto à "Rolling Stone", deixando subentendido que não tinha planos para um novo disco.

"Continuo em turnê e compartilhando com públicos do mundo todo, mas também trabalho em tempo integral com o trauma, a sufocação e o atrofiamento que vieram com tudo isso e como minha família e eu fomos afetados. Se ser uma superstar significa viver uma vida reprimida, onde as pessoas só trabalharão com você ou investirão no seu trabalho se puderem manipulá-lo e controlá-lo, então não sei quão importante é fazer música sem uma série de eventos trágicos subsequentes. Eu não concordo com isso".