Só 20% das empresas pagam a tempo e horas

Portugal continua a posicionar-se mal no cumprimento dos pagamentos aos fornecedores por parte das empresas. Segundo um estudo da Informa D&B, a que o Observador teve acesso, em maio de 2025 apenas 20% das empresas em Portugal cumpriam os prazos de pagamento acertados com os fornecedores. Ou seja, só 20 em cada 100 empresas em Portugal paga a tempo e horas, o mesmo é dizer que 80 de 100 não cumprem.
A conclusão está na 11.ª edição do estudo sobre os comportamentos de pagamento da Informa D&B que coloca, mesmo, a nível internacional, Portugal como ocupante de um dos piores lugares, “estando cada vez mais longe da média da União Europeia”.
Se apenas 20% das empresas pagam dentro dos prazos acordados, o estudo indica que 65,6% paga com um atraso de até um mês. 9,1% pagam com um atraso de entre 30 e 90 dias e com mais de 90 dias de atraso estão 5,3%. E nas grandes empresas apenas 4% pagam a tempo e horas.
O atraso nos prazos de pagamento é crítico na análise de risco comercial. A Informa D&B realça que “estes atrasos induzem impactos negativos nas empresas credoras, condicionando a sua capacidade na obtenção de empréstimos e na realização de investimentos com vista ao seu crescimento”, além de gerarem “um círculo vicioso que atinge empresas que pertencem à mesma cadeia de clientes e fornecedores, afetando sobretudo empresas mais vulneráveis, como as PME, onde as dificuldades de tesouraria podem pôr em causa a sua própria viabilidade”. O efeito dominó vem como consequência. 31% das empresas atrasaram pagamentos a fornecedores depois de terem elas próprias recebido com atraso.
Assim, de acordo com o indicador de risco delinquency da Informa D&B há 43 mil empresas que apresentam um nível médio-alto ou elevado de registar um atraso de pagamento superior a 90 dias a pelo menos um dos credores no prazo de um ano.
Apesar destes números, o comportamento até tem melhorado. Nos dados a que o Observador teve acesso verifica-se que se hoje 20% pagam a horas, há 5 anos esse valor era de 15%, tendo a percentagem de empresas com atrasos superiores a 90 dias descido de 7% para 5%.
Houve, ainda, uma diminuição do número médio de dias de atraso nos pagamentos. Está atualmente nos 22,6 dias, quando há 5 anos (em 2020) estava nos 26,6 dias, ou seja, menos quatro dias.

Fonte: Informa D&B
As grandes empresas, ou seja que têm mais de 249 trabalhadores, são as que menos pagam dentro dos prazos. Apenas 4% o fazem, conclui a Informa D&B, revelando que 86% acaba por pagar com um atraso de até 30 dias, pagando as restantes com atrasos superiores a um mês (apenas 1%, no entanto, com mais de 90 dias de atraso). Do lado oposto, são as microempresas (até 9 empregados) que mais cumprem. 24% pagam a tempo e horas, mas também são as que apresentam maior percentagem de pagamentos com atrasos superiores a 90 dias (6%). 19% das pequenas empresas cumprem prazos e 11% das médias também o fazem.

Fonte: Informa D&B
Na análise da Informa D&B verifica-se que o incumprimento é transversal a todos os setores de atividade. As tecnologias de informação e comunicações (TIC) são as mais cumpridoras, com 28% a pagarem dentro dos prazos acordados. O setor menos cumpridora é o dos transportes (11%).
Na média de dias de atraso há um dado que sobressai no estudo deste ano. O retalho foi o único analisado que aumentou o número de dias de incumprimento para 21 dias.

Fonte: Informa D&B
Se há transversalidade de setores, também há nas regiões de sede das empresas. A Região Autónoma da Madeira é a que tem a percentagem mais baixa de cumpridoras (16%), estando no centro a taxa mais elevada (22%). A Grande Lisboa está com um nível de cumprimento de 21%, enquanto o Norte que é o segundo pior (18%). Alentejo, Algarve e Península de Setúbal estão na média, com um cumprimento de 20%, enquanto o Oeste e Vale do Tejo e os Açores ficam-se pelos 19%.
Portugal afasta-se da média europeiaCom este cenário, e apesar da melhoria, Portugal continua a afastar-se da média europeia, que tem recuperado melhor. A diretiva europeia de pagamentos, transposta em 2013, determina um prazo máximo de pagamento de 60 dias entre empresas, podendo ser firmados acordos para maiores períodos. Mas o estudo avalia o incumprimento face aos prazos acordados.
O panorama desde 2013 não melhorou de forma significativa, pelo menos no caso de Portugal. Segundo dados da Informa D&B, “a percentagem de empresas na União Europeia (UE) que cumprem os prazos passou de 38% em 2013 para os 49% no final de 2024”. Nesse período, em Portugal a percentagem de cumpridores subiu dos 17% para os 19%. “Em resultado destas evoluções, a diferença entre Portugal e a UE era de 21 pontos percentuais em 2013 passando para 30 pontos percentuais no final do ano passado”. O “gap” está maior.

Fonte: Informa D&B
Portugal fica assim no pelotão de trás. Está entre os piores pagadores, sendo apenas a Roménia com pior nível (12%). A Dinamarca é a maior cumpridora — 94% das empresas pagam a horas neste país. Os principais parceiros comerciais de Portugal são mais certinhos nos pagamentos. 62% das empresas alemãs pagam a tempo, 59% das companhias dos Estados Unidos e do Reino Unido cumprem, 46% das companhias francesas cumprem, e 44% das espanholas pagam a horas.
Estado
O estudo, que será apresentado esta sexta-feira na conferência ‘O Impacto de Pagar a Horas’, organizada pela ACEGE (Associação Cristã de Empresários e Gestores) e pelo Santander, não olhou para a realidade do Estado. No entanto, a ACEGE fez a sua análise ao setor público e o panorama também não é positivo, apesar das declarações públicas de se pretender reduzir a dívida aos fornecedores.
Segundo indicam números da associação, a que o Observador teve acesso, o Estado tinha, em maio de 2025, um montante em dívida a fornecedores, com mais de 90 dias de atraso, de 628 milhões de euros. A 31 dezembro do ano passado era de 289 milhões. Em maio do ano passado o valor estava em 542 milhões.
Está ainda nos hospitais EPE o principal e crónico problema, mas, no final de cada ano, as suas dívidas acabam regularizadas “quase na totalidade”, realça a ACEGE. Se a administração central tem mantido os valores em dívida (sem a saúde apresentava um montante de 50 milhões em dívida), a administração local continua “um caminho exemplar” de descida (para valores próximos de 25 milhões) e a regional “continua um caminho de subida ligeira (para 205 milhões) mas constante desde 2021”. Para a ACEGE, a situação regional é considerada “inaceitável, em dissonância com o caminho que Portugal deve seguir”.
observador