Vida, tutorial do usuário

Um dos grandes romances do século XX é La vie: mode d'emploi, de Georges Perec, pelo qual o autor francês ganhou o Prêmio Médicis em 1978. Perec imagina um prédio de dez andares, incluindo sótão e porão, no número 11 da fictícia rue Simon-Crubellier, em Paris, e se propõe a narrar as histórias de seus moradores no presente narrativo (23 de junho de 1975) e no passado do prédio, em um quebra-cabeça de 99 capítulos composto por várias condições ocultas, os famosos obstáculos ( contraintes ) do grupo Oulipo, do qual Perec era um membro proeminente. Agora, a Proa acaba de reeditar a premiada tradução catalã publicada por Ramon Lladó e Annie Bats em 1998 ( La vida manual d'ús ).

Amanhã e segunda-feira, serão 28 horas de leitura contínua de 'La vie: mode d'emploi'.

Há romances, como Ulisses, de Joyce, que concentram sua ação em um único dia, que seus leitores comemoram com alegria. Tomando como modelo o Bloomsday de Joyce (16 de junho), os escritores de Perec, Kim Nguyen e Enric Parellada, organizaram uma leitura contínua em voz alta do texto completo desta obra-prima. Nguyen é autor de Por que Georges Perec (La uÑa RoTa, 2024), e Parellada publicou contos surpreendentes, incluindo aqueles da coletânea ainda inédita L'aberració (Llibre de contines) .

Aproveitando o 50º aniversário desta narrativa, 101 leitores visitarão de forma ordenada a Livraria Calders, em Barcelona, ​​para ler os 99 capítulos do romance, além do prólogo e do epílogo, na versão que cada leitor preferir: o original francês, a tradução catalã de Lladó & Bats, a tradução espanhola de Josep Escué para Anagrama, ou qualquer outra.

A leitura contínua ocorrerá amanhã, domingo, dia 22, das 8h às 23h59, e na segunda-feira, dia 23, das 8h às 20h, data da morte do enigmático Percival Bartlebooth.

O rico protagonista do romance traça um plano de vida extraordinário baseado na busca por paisagens, espalhadas pelo mundo, dignas de serem imortalizadas em uma aquarela que um especialista transforma em quebra-cabeças, com a intenção de que o pintor passe a velhice reconstruindo as paisagens que visitou na juventude.

Entre as primeiras palavras da livreira Isabel Sucunza, que precederá Adrià Pujol Cruells, e as últimas palavras de um leitor secreto que chegará, depois de Kim Nguyen, no momento exato da morte de Bartlebooth, terão passado exatamente 28 horas de leitura em voz alta.

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Há meio século, Georges Perec deu ao seu grande romance o título dos manuais de instruções impressos que frequentemente acompanhavam todos os eletrodomésticos. Hoje, esse tipo de literatura evoluiu para tutoriais no YouTube, podcasts em vídeo e stories no Instagram. É justo, portanto, que a obra de Perec dê o salto para a realidade audiovisual da vida.