Excesso de estímulo e atenção instável, marcas e clientes na era da preguiça

"A gentileza é uma arma poderosa e nunca antes vista." Palavras do Superman, um dos super-heróis mais longevos, nascido em 1933 e o arquétipo de alguém que enfrenta o mal com habilidades extraordinárias. Em um mundo marcado pelo caos, este símbolo de resiliência retorna às telonas e às campanhas publicitárias. Em vista da estreia em 11 de julho, a gigante americana de seguros Progressive, sexagésima segunda colocada na Fortune 500 e com faturamento de mais de 22 bilhões de dólares no primeiro trimestre do ano, decidiu vestir o traje do Superman para demonstrar seu compromisso em garantir a segurança dos serviços, a rapidez nas respostas e a precisão nas soluções. O objetivo é simplificar a vida do cliente, tornando-a mais simples. Assim, superpoderes são usados contra um cliente conectado, entediado e intolerante. Uma das funções do aplicativo detecta acidentes graves, intervém para garantir sua saúde, envia ajuda e até inicia um pedido de indenização. Uma velocidade (quase) sobre-humana.
Bem-vindos à economia emergente da preguiça que reescreve o consumo e as campanhas. Estamos cada vez menos inclinados a tomar medidas para interceptar produtos, serviços e mensagens. A preguiça, graças às tecnologias de alto desempenho e personalizadas, torna-se a principal concorrente na batalha pela atenção de um consumidor instável, mas também a aliada mais valiosa para incentivar novas propensões à compra. A McKinsey destaca como simplicidade, velocidade e intuitividade são cada vez mais exigidas na experiência digital, confirmando o avanço dos modelos sem atrito, um conceito cunhado por Kevin Roose no New York Times. A tendência de simplificar o impacto da tecnologia significa que vivenciamos uma bulimia de compras digitais, muitas vezes sem perceber. É o avanço das marcas invisíveis para o tecnólogo americano William Ammerman. Enquanto isso, o relatório Tendências de Mercados de Consumo 2025 da PwC relata que 67% dos líderes de consumo estão apostando na inteligência artificial para aprimorar a experiência de compra, reduzir o atrito e atender à crescente demanda por automação e fluidez nas interações. 36% das empresas afirmam que já estão adotando IA generativa em diversas áreas. A Geração Z está reformulando expectativas, considerando seus dados pessoais como moeda para experiências hiperpersonalizadas e compras sem atrito: no entanto, há um equilíbrio com a privacidade, apontada como prioridade por 48% da amostra. "O consumidor digital busca a máxima conveniência com o mínimo de esforço. O hábito de 'tudo agora' tornou qualquer atrito um obstáculo insuportável. O valor é cada vez mais medido em termos de tempo economizado e facilidade de uso", afirma Giulio Finzi, líder de varejo da Intarget e professor de e-commerce na Universidade Católica de Milão. Os riscos para aqueles que estão conectados e distraídos também estão aumentando. "A experiência sem atrito reduz o limiar de atenção e aumenta o risco de compras por impulso, golpes ou compartilhamento involuntário de dados sensíveis. Os usuários devem estar atentos à transparência dos processos, à identidade dos vendedores e ao uso de seus dados pessoais, especialmente os grupos menos digitais", afirma Finzi.
É a vez dos agentes de IA se tornarem coaches ao alcance dos smartphones, assistentes pessoais em rolagem infinita para fomentar novas necessidades. Amazon, Google e Shopify estão entre os players mais avançados no uso de agentes para recomendações, assistência e personalização. A Zalando desenvolveu um assistente de conversação, e a Sephora, um coach de beleza com IA que recomenda, aprende e personaliza. «O futuro pertence àqueles que integram IA não apenas nos processos, mas na experiência de compra. As empresas devem repensar a jornada do cliente de forma preditiva e automatizada. Os agentes de IA – verdadeiros personal shoppers – simplificam as escolhas, transferindo o poder de compra dos usuários para as interfaces. Para as empresas, isso significa redefinir estratégias de conversão e estar prontas para o marketing BtoMachine, ou seja, voltado para influenciar uma IA e não um humano», conclui Finzi. Os agentes transformam marcas em presenças não apenas ativas, mas proativas. A McKinsey estima que, até 2030, mais de 60% das interações serão mediadas por agentes autônomos. "Na América, a adoção de agentes no consumo está crescendo, enquanto na Europa uma abordagem mais exploratória ainda domina. Os jovens preferem fluxos personalizados, os idosos preferem atendimento simplificado. Mas o esforço mínimo é a regra transversal, mais do que a idade. Afinal, estamos em sobrecarga cognitiva: muitos estímulos, pouco tempo, atenção fragmentada. Preguiça não é falta de vontade, mas uma resposta adaptativa. Vencer significa eliminar atritos, antecipar necessidades e reduzir ao mínimo o pensamento na tomada de decisões. O conforto vence a comparação. A IA se torna a interface confortável do nosso cansaço", diz Fabio Lalli, autor de "Spatial Shift" para a Egea. O excesso de conforto reduz o limiar crítico: aceitamos cookies, contratos, condições sem pensar ou ler o que está escrito. Os riscos? "Privacidade, manipulação, dependência de recomendações opacas, renovações de assinatura sem consciência, os famosos padrões obscuros. A questão é cultural: treinar a inteligência situacional em um mundo onde tudo parece já decidido para nós é central", diz Lalli. Enquanto isso, as formas de usá-la estão mudando, indo além do toque. Trata-se de uma interação espacial que está se movendo para fora da tela: é o mercado de realidade mista, composto por lentes inteligentes, gestos tecnológicos e vozes sintéticas. «A realidade mista elimina a interação ativa tradicional: sem cliques, sem deslizar. A informação chega ao espaço, contextual e aumentada. Você olha, fala, recebe. Apple Vision Pro, Meta Quest e todos os visores e óculos que estão começando a surgir, ou soluções como a Brilliant Labs, integram gestos e voz em experiências imersivas. A interface se torna invisível e o comportamento, mais passivo e guiado. Devemos permanecer vigilantes, pois o aumento do tédio da realidade está próximo», conclui Lalli.
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