Mortes de criança e polícia são resquícios de manifestações

O bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique disse esta quinta-feira que a morte de uma criança a tiro e linchamento de um polícia em Maputo são “resquícios” das manifestações pós-eleitorais, considerando a situação de direitos humanos complicada no país.
“O nosso posicionamento para a situação de Bobole é que a nossa nação ainda não serenou. Portanto, ainda vivemos resquícios do processo eleitoral“, disse Carlos Martins, referindo que existem indicações “muito claras” de que o país precisa de pacificação para o desenvolvimento.
Em declarações aos jornalistas, à margem de um evento público em Maputo, o bastonário classificou como complicada a situação dos direitos humanos no país, criticando a atuação da polícia e dos populares, além de sugerir uma investigação para apurar responsabilidades.
“Naturalmente, para a morte da criança está claro que houve um disparo efetuado pela polícia, é mais claro. Relativamente à população, é muito mais complicado [apurar a responsabilização], porque são pessoas indetermináveis. Portanto, só uma investigação é que poderá apurar. Mas, claramente que a Ordem dos Advogados não é a favor de justiça pelas próprias mãos”, disse Carlos Martins.
Em causa estão quatro agentes da polícia moçambicana que alegadamente mataram, na segunda-feira, a tiro, uma criança de 12 anos, em Bobole, província de Maputo, sul do país, durante uma perseguição, usando um carro particular, à viatura em que o menor seguia com os seus pais para a província de Manica, no centro de Moçambique, provocando assim revolta popular que culminou com linchamento de um agente da Polícia da República de Moçambique (PRM).
A polícia moçambicana avançou na segunda-feira que foi instaurado um processo disciplinar contra os agentes “com vista à sua expulsão”, enquanto decorrem outras diligências para a responsabilização criminal dos polícias envolvidos no baleamento mortal da criança.
O Comando-Geral da PRM lamentou as mortes da criança e do agente da corporação e pediu que a sociedade moçambicana não se paute pela justiça “pelas próprias mãos, independentemente das circunstâncias”.
O ministro da Justiça moçambicano admitiu na quarta-feira a possibilidade de ter havido excesso de zelo ou desvio de comportamento na operação policial, garantido a responsabilização dos envolvidos.
Também a Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) moçambicana disse na quarta-feira que a morte a tiro de uma criança por polícias demonstra uma grave violação dos direitos fundamentais e humanos, condenando também a morte de um dos agentes envolvidos.
Moçambique viveu desde as eleições de 9 de outubro de 2024 um clima de forte agitação social, com manifestações e paralisações convocadas pelo ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, que rejeita os resultados eleitorais que deram vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frelimo, no poder, e empossado como quinto Presidente do país.
Cerca de 400 pessoas morreram em resultado de confrontos com a polícia, conflitos que cessaram após encontros entre Mondlane e Chapo em 23 de março e em 20 de maio, com vista à pacificação do país.
observador