Visitámos a faculdade onde a Infanta Sofía vai estudar

Subimos a Rua das Flores a partir do Cais do Sodré, caminhando pelas calçadas lisas e inclinadas e a desviar dos turistas que circulam a procurar cafés, lojas de vinho e concept stores. Seguimos pela paralela à Rua do Alecrim e dobramos à esquerda depois de passar o Largo Camões. Atravessamos a parte superior do elevador da Bica, onde várias pessoas fotografam o (agora parado) elétrico no topo da calçada, e depois atravessamos a rua para subir uma travessa que, apesar da zona central e extremamente movimentada, parece bastante mais tranquila. Um caminho que a filha mais nova dos Reis de Espanha poderá fazer com frequência nos próximos meses, já que é aqui que vai assistir à maioria das aulas do seu primeiro ano de faculdade. Sofía será a pioneira na família a seguir um percurso universitário no estrangeiro: vai estudar Ciências Políticas e Relações Internacionais na Forward College, uma escola com um programa de estudos de três anos em que o primeiro deles é feito nas instalações em Lisboa, com o segundo ano em Paris e o terceiro em Berlim.


▲ A rua Luz Soriano, no Bairro Alto, onde fica o Interpress - Hub Criativo do Bairro Alto
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
A faculdade tem atualmente dois campi: o primeiro na Rua das Flores, no Chiado, e o outro, a estrear, na Rua Luz Soriano, no Bairro Alto. O prédio onde funcionou o Diário Popular nas décadas de 1950 e 1960 fica numa travessa com pouco comércio e restauração. É exatamente no piso onde no passado já esteve a redação do Observador que hoje os alunos da Forward, incluindo Sofía, estudam. Ao chegar no local vê-se logo o espaço amplo sem paredes onde se dispõem mesas de reunião, uma área que é destinada ao convívio dos alunos — assim como a esplanada ensolarada, que permite ver as janelas e telhados de prédios vizinhos. Entramos e seguimos pelo longo corredor, decorado com quadros que fazem alusão a Lisboa e incluem frases motivacionais. “A forma como falas para ti próprio importa. Para de procurar a perfeição e sê tu mesmo”, diz uma imagem. Na outra parede, vemos as portas das quatro salas de aula. A primeira delas diz “Belém” à entrada — lá dentro as paredes são forradas com azulejos portugueses originais. Já as outras, Santos, Estrela e Marvila, são mais simples, com paredes brancas. Todas tem capacidade para aproximadamente 15 alunos, um dos “diferenciais” da faculdade, que preza ter turmas pequenas.
Ao sair do corredor encontramos as escadas que levam às instalações onde o Observador tinha um estúdio de fotografia e vídeo — o silêncio necessário também para a nova finalidade do espaço. Na sala de meditação, com pufes distribuídos pelo chão e candeeiros que iluminam apenas o suficiente, os alunos podem ler, relaxar e até dormir uma sesta. A proposta é fornecer as ferramentas para que os jovens desenvolvam competências sociais e emocionais. “Com a Inteligência Artificial cada vez mais sofisticada, a inteligência cognitiva está a ser substituída pela máquina, e há uma necessidade maior de preparar os estudantes holisticamente, para desenvolver a inteligência emocional, social e prática. Esta abordagem holística está no core da faculdade”, explica-nos Céline Boisson, co-fundadora da faculdade, criada em 2021. A meditação é apenas um elemento desta estratégia pedagógica. Nas primeiras duas semanas de apresentação os estudantes envolvem-se em aulas de surf e yoga na praia, competições de culinária ou cinema, entre outras atividades que representam o estilo de vida lisboeta.






Quando começou, em 2021, a faculdade tinha uma turma de 25 alunos — agora prepara-se para receber 115 para as primeiras duas semanas de integração em Lisboa. A Forward College foi fundada por Boris Walbaum, que trabalhou como conselheiro financeiro no governo Francês entre 1999 e 2002 e foi consultor de educação por 15 anos. Os co-fundadores são Céline Boisson, que já trabalhou em empresas de tecnologia como o Youtube e a Google, e Jeffrey Sampson, que trabalhou por 11 anos na Apple e esteve em equipas de outras marcas grandes como a Christie’s e a Gap. O projeto é financiado por multimilionários como a família Meyer Louis-Dreyfus, o empresário do ramo das telecomunicações Xavier Niel, que é companheiro da CEO da Dior, Delphine Arnault, Agnès Ifker, antiga presidente da Galileo Global Education, empresa de educação privada, e o marido Stéphane Ifker, do fundo de investimentos Antin, ou Corinne Vigreux, a fundadora da TomTom, multinacional que desenvolve GPS’s e sistemas de navegação para carros e criadora do Codam School, uma escola de programação. Em 2023, a faculdade anunciou um investimento de 12 milhões de euros no projeto, o que possibilitou a abertura do campus em Berlim, que Sofía deve frequentar no terceiro ano da licenciatura.
A ideia que diferencia esta de outras faculdades, segundo Céline, é a de que o método de ensino tradicional não é o mais adequado para os tempos em que vivemos. “É basicamente uma transferência de conhecimento de um professor em frente a muitos alunos numa espécie de anfiteatro. Esta transferência, nós sabemos através da neurociência, não é a forma mais forte de fazer os alunos aprenderem. Com a IA, o conhecimento está em todo lugar. O nosso método é inovador pelo aspeto de ter turmas pequenas em que aplicamos uma pedagogia de aprendizagem ativa, em que os alunos precisam de se preparar para as aulas. Queremos que desenvolvam competências de pensamento crítico”.




▲ A escola tem uma sala com paredes de azulejos portugueses e um espaço criado para que os alunos possam meditar, relaxar ou tirar uma sesta
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
A Forward College já tem um grau de licenciatura reconhecido pelo ministério da Educação francês, além da parceria com a University of London. Os programas em economia, ciências políticas, relações internacionais, ciência de dados, psicologia e administração são desenvolvidos em conjunto com a London School of Economics ou pelo King’s College London e credenciados pela universidade britânica. Os cursos também podem incluir uma componente de liderança e empreendedorismo, sendo possível completar em três anos o equivalente a duas licenciaturas. Os preços variam entre os 18.500 e os 22.500 euros, mas a faculdade diz que estão disponíveis ajudas financeiras.


▲ Nas paredes há frases motivacionais e recordações do estilo de vida lisboeta
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
A irmã de Leonor terá sido selecionada entre os cerca de 2 mil candidatos, de nacionalidades variadas destacando alemães, franceses, italianos, portugueses e norte-americanos. “Acreditamos numa comunidade pequena, que é importante para que todos se conheçam. Investimos muito na construção desta comunidade”, explica Céline. A escola assume que nunca teve alunos high profile no passado, mas garante que trata “todos da mesma forma. Confidencialidade, é claro, é um elemento essencial da nossa política, mas não há tratamento especial“.
De acordo com Céline, os estudantes são escolhidos com base no potencial académico e num depoimento pessoal. “A depender do programa, olhamos para temas específicos. No curso de Política e Relações Internacionais, olhamos para o desempenho em história e geografia“, destaca a co-fundadora, ao falar sobre o curso que a infanta de Espanha vai frequentar. “Os nossos alunos têm em comum a curiosidade e a abertura ao mundo”, diz ainda, assinalando que os estudantes aprendem português, francês e alemão ao longo do percurso académico. Sofía já fala as línguas oficiais do Estado espanhol (catalão, basco e galego) desde criança, e aprendeu inglês, mandarim, francês e árabe na secundária — mas muito provavelmente também já sabe português, pelas relações próximas dos dois países.

▲ Céline Boisson é uma das co-fundadoras da faculdade, que foi criada em 2021
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
A residência estudantil onde ficam os alunos está localizada em Benfica, e tem quartos entre 13 e 20 metros quadrados que custam entre 590 e 690 euros por mês. O prédio ainda tem ginásio, lavandaria, lounge, sala de estudo, jardim privado e garagem. Não existe confirmação sobre se a infanta vai residir com os colegas, apesar da co-fundadora da faculdade destacar a importância da experiência de viver em comunidade para a abordagem pedagógica da universidade. “Os nossos alunos vivem e estudam juntos por três anos e acreditamos que isto é muito importante para a nossa abordagem não só da questão holística, mas de habilidades. Acreditamos que vai fazer a diferença no futuro eles terem vivido com uma comunidade composta por pessoas de 40 nacionalidades por três anos, em três países diferentes, com a necessidade de adaptarem-se a culturas diferentes”, afirma Céline.
Primeira a romper com a tradição realAo escolher este percurso académico, Sofía rompe com algumas tradições reais. Isso porque, até agora, a filha mais nova dos Reis seguiu a irmã, a princesa Leonor, e fez o Bacharelato Internacional no UWC Atlantic College, no País de Gales. Porém, a herdeira ao trono espanhol fez uma formação no Exército e na Marinha e inicia agora o estágio na Força Aérea, enquanto Sofía, para já, não deve passar por nenhuma formação militar. A infanta também é a primeira a procurar uma licenciatura fora de Espanha. Felipe VI, por exemplo, cursou Direito na Universidade Autónoma de Madrid e só depois fez mestrado na Universidade de Georgetown, nos EUA.
De acordo com fontes próximas da realeza ouvidas pela Vanitatis a decisão pela Forward College não terá sido fácil e envolveu muita conversa entre os Reis e a infanta. Sofía queria um destino internacional onde pudesse conhecer novas culturas e ainda assim ter alguma privacidade, o que é praticamente impossível dentro de Espanha. Mas a primeira opção da infanta era por um curso na área das artes, com a qual os Reis não terão concordado, considerando que, para a segunda pessoa na linha de sucessão ao trono, seria mais adequado o programa de Ciências Políticas e Relações Internacionais. Felipe e Letizia acabaram por aceitar a escolha final pela proximidade geográfica — já que Lisboa, Paris e Berlim permitem uma deslocação rápida de até duas horas e meia até Espanha quando necessário.

▲ Aos 18 anos, Sofía começa a participar com mais frequência nos compromissos oficiais da realeza espanhola
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No segundo ano o curso de Sofía segue para a capital francesa, mais especificamente para a Cité Internationale Universitaire de Paris, onde a Forward está sediada ao lado de outras centenas de universidades francesas e internacionais. É a maior acomodação para estudantes e investigadores da região, recebendo jovens de 150 nacionalidades todos os anos nas suas mais de 40 casas, enquanto as aulas são ministradas em salas de estudo ou na biblioteca. A escola calcula que os alunos podem gastar entre 16 e 20 mil euros em alojamento, alimentação e serviços gerais durante o ano em que estiverem a estudar em Paris. Já em Berlim decorre o terceiro ano de estudos, no centro da Forward College que fica dentro de um espaço de coworking em Kreuzberg. Na capital alemã a faculdade tem parcerias com quatro residências estudantis, com preços entre os 550 e os 1200 euros por mês.
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