Cessar-fogo. Rússia apresenta duas opções a Kiev

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“Durante mais de uma semana, os russos não conseguiram apresentar este chamado ‘memorando’. Infelizmente, a Rússia está a fazer tudo o que pode para garantir que uma potencial reunião futura não produza quaisquer resultados”. Na sexta-feira, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, continuava a criticar fortemente a postura russa para se alcançar um acordo de cessar-fogo permanente e acabar a guerra na Ucrânia. Três dias depois, o documento chegou às mãos do poder de Kiev, após a reunião que juntou negociadores russos e ucranianos em Istambul, mas a proposta tem tudo para estar longe daquilo que o Chefe de Estado ucraniano pretende aceitar.
No documento, a que a imprensa russa teve acesso, a Rússia propõe um primeiro cessar-fogo de dois a três dias para permitir uma recolha dos corpos dos soldados mortos no campo de batalha. Depois, para chegar a um cessar-fogo permanente, Moscovo dá duas opções a Kiev — ambas implicam vastas concessões por parte de Kiev e abrem caminho para uma paz desenhada totalmente pelo Kremlin.
Opção 1: Retirada dos ucranianos dos territórios ocupadosA primeira opção, segundo o texto do memorando publicado pela agência russa Interfax, centra-se apenas na retirada das tropas ucranianas das quatro regiões do país que a Rússia tem vindo a ocupar desde o início da guerra: Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporíjia.
Opção 2: um “pacote” de exigências a KievUcrânia ataca quatro bases aéreas na Rússia e atinge mais de 40 aviões bombardeiros
A segunda, descrita como um “pacote”, é mais complexa. Primeiro, a Ucrânia teria de parar o seu exército, a não ser para uma retirada para uma distância de segurança das fronteiras.
A Ucrânia também não poderia receber mais apoio militar do estrangeiro e uma eventual presença de uma força de manutenção da paz ou de quaisquer militares de fora seria também descartada, tal como uma “participação de especialistas estrangeiros” em ações das forças ucranianas. Seria também criado um “centro bilateral de monitorização e controlo do cessar-fogo”, lê-se.
No texto, é definido também que Kiev não poderia participar em “atividades de sabotagem e subversivas contra a Federação Russa” e que os “presos políticos” de ambos os países seriam amnistiados e libertados.
Kiev e Moscovo acordam troca de todos os prisioneiros entre os 18 e 25 anos
A Ucrânia seria ainda obrigada a mudar politicamente. A lei marcial implementada devido à guerra, que tem adiado eleições no país desde 2022, seria abolida, obrigando a haver eleições presidenciais e legislativas no país no espaço de cem dias.
O último ponto implica a maior concessão: a Ucrânia tem de concordar com a visão que Moscovo tem para o país no pós-guerra, descrita na secção 1 do memorando.
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Na secção intitulada de “parâmetros do acordo final”, exige-e logo que as quatro regiões ocupadas depois de 2022, assim como a região da Crimeia, passassem a ser reconhecidas internacional como território russo.
Já sem esses territórios, quem passasse a governar a Ucrânia não poderia pedir a entrada em qualquer aliança militar, nem podia ter receber nenhuma força militar de outro país depois. As próprias forças ucranianas seriam reduzidas ou, pelo menos, limitadas a um teto máximo definido pelo acordo.
A Rússia exige também uma “proibição legislativa da glorificação e propaganda do nazismo e do neonazismo” na Ucrânia — uma alegação usada como justificação da invasão russa. A “garantia da plenitude dos direitos, liberdades e interesses” da população que fala russo (maioritariamente concentrada nos estados que seriam anexados por Moscovo) teria também de ser reconhecida pela Ucrânia.
Por fim, de acordo com o texto, as sanções feitas à Rússia seriam todas levantadas e as relações diplomáticas e também económicas entre Kiev e Moscovo seriam restabelecidas.
Segundo um “mapa” desenhado pelos representantes ucranianos e ao qual a Reuters terá tido acesso, Kiev parece, mais uma vez, apontar num lado totalmente oposto de Moscovo. Nele, a Ucrânia recusa quaisquer restrições à sua capacidade militar, assim como o reconhecimento internacional da anexação de territórios ucranianos pela Rússia.
De facto, os representantes ucranianos saíram de Istambul com uma visão maioritariamente negativa sobre o que foi atingido, apesar do acordo para uma troca de prisioneiros feridos entre os 18 e os 25 anos.
Na conferência de imprensa ainda na Turquia, o ministro da Defesa ucraniano, Rustem Umerov, contou que a análise do memorando pelas equipas de Kiev iria durar uma semana. Depois, na rede social X, Umerov disse que a troca de prisioneiros foi “o único progresso verdadeiro atingido” e criticou a recusa da Rússia em aceitar a principal proposta ucraniana: um cessar-fogo imediato de 30 dias.
I briefed the President of Ukraine @ZelenskyyUa on today’s meeting with the Russian side in Istanbul.
Upon returning to Kyiv, I will also present the Russian proposals — which they shared only today, directly during the negotiations.
The Ukrainian side acted clearly and… pic.twitter.com/MYuw15BPQw
— Rustem Umerov (@rustem_umerov) June 2, 2025
“Parece que o lado russo está mais uma vez a empatar, tentando criar uma ‘imagem diplomática’ para os EUA, mas sem quaisquer ações reais por detrás”, criticou o ministro na rede social X.
O próprio Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, chamou os representantes russos de “idiotas” pela proposta de cessar-fogo de dois a três dias para recolher corpos dos soldados mortos. “Fundamentalmente, um cessar-fogo serve para que não haja mortos”, justificou.
Já o chefe de gabinete do Presidente ucraniano, Andriy Yermak, deixou também um ataque muito claro à Rússia numa publicação na rede social X.
“Os russos estão a fazer tudo o que podem para evitar um cessar-fogo e continuar a guerra. Novas sanções são extremamente importantes neste momento. A racionalidade não é algo que se aplique à Rússia“, acusou Yermak.
Russians are doing everything they can to avoid a ceasefire and continue the war.
New sanctions are critically important right now.
Rationality is not something that applies to Russia.
— Andriy Yermak (@AndriyYermak) June 2, 2025
observador